sábado, 21 de setembro de 2013

Hiato





Aproveite bem  sua existência, 
Pois bem cedo irá partir no trem.
A estação antes colorida,
Agora jaz, enfraquecida.

Aproveite bem sua companhia,
Ria, tome sorvetes, ande na praça.
A amargura da solidão logo lhe desgraça
E a mão dantes terna , encarcaça.

Vá. Aproveite bem a companhia,
Do filho querido em plena alegria,
Pois o momento da despedida
logo logo te abraça.

O trem tem hora , não demora.
Passa rápido pela estação.
Leva consigo a lembrança mais feliz
Apunhalando seu coração.

Suas palavras já não soam bem,
Seus conselhos, entregues ao desdém.
Sua ajuda não mais necessária,
Desfaz-se melosa, na sua couraça.

Vá. Aproveite bem a companhia,
Daquele que um dia sorriu para ti.
Da janela do trem parte em retirada
Levando consigo a doce alvorada.

Aconchegue -se  no triste banco da praça,
Lembrando momentos de cumplicidade
Que jaz em breve suspiro seu.
Arruma sua roupa, vista-se taciturno
Ajeite o chapéu de sua alma
E receba o eterno apogeu.

O filho querido parte em desalinho
Levando consigo parte de seu sonho
Palavras ditas e longos desenganos
Truncados em linhas de metáforas perdidas
Alcançam agora trilhas feridas.

Vá. Aproveite bem e se refaça.
Um dia há de voltar pedindo sua graça,
Querendo seu amor que ainda na praça
Reza pela alma que tanto lhe enlaça. 

Vá. Acalma o coração.
Sente-se no banco e refaça a oração, 
Pois um dia, ainda que velho e enferrujado de todo,
Mesmo que sirva só de consolo tardio
A lembrança do filho esguio
Te encontra com o amor gentio.
Vá. Sorria. 
O trem retorna em breve e com alegria:
O filho querido ao seu retorna
Trazendo consigo substantivadas histórias 
Que você um dia ensinou.

Beijar-lhe-á as mãos
E com grande sentimento e redenção
Seus olhinhos acinzentados mirarão
E uma lágrima sentida irá brotar.

Verás então, que o nada e o vão
Meros hiatos em atenção
Perderam-se na luz da transformação
Refazendo a caminhada em profusão...
Ao povo, vos digo agora:
as vestes rasgadas e rotas,
que tanto reclamam de mim,
foram-me entregues outrora.

Não me aborreço com disse-me-disse,
que tais vestes revelam.
Meu caráter é mais singelo,
que a seda rota devora.

Meu caminho é de luz,
embora as vestes não o sejam.
Cristo morreu na cruz,
amando aquele que não o deseja.

Portanto, larguem as vestes de hoje
que meu corpo retém.
Sem elas caminho ao lado
de minha cruz e mais ninguém!